Emendas parlamentares viram arma política do Congresso e colocam o Brasil em estado de calamidade
- Karina Pinto
- 24 de jul.
- 2 min de leitura
Enquanto o Congresso Nacional pressiona o governo federal por mais recursos para emendas, investigações da Polícia Federal e de órgãos de controle revelam o uso político, irregular e suspeito desses repasses — que, em vez de favorecerem a população, alimentam esquemas e interesses de grupos específicos. A conta, como sempre, sobra para o povo.

Por trás do discurso da “destinação de recursos para as bases”, um rastro de obras inacabadas, municípios em calamidade financeira e uma máquina de chantagem institucional que paralisa o país. Um dos casos mais escandalosos vem de Roraima: o município de São Luiz do Anauá, com pouco mais de sete mil habitantes, recebeu R$ 126 milhões em emendas parlamentares entre 2020 e 2025. Isso equivale a R$ 17 mil por morador — um valor 33 vezes superior à média nacional.
Apesar da abundância, a cidade acaba de decretar calamidade financeira. Não há dinheiro para pagar salários, fornecedores, nem concluir obras. Onde foi parar o dinheiro? Segundo a atual gestão, milhões foram pagos por projetos nunca entregues: parque, praça, portal monumental, casas populares. Tudo pago, nada feito. Boa parte dos recursos chegou via emendas do tipo “Pix”, modalidade que permite o envio direto de verba da União a prefeituras sem a exigência de um plano de trabalho prévio ou de fiscalização efetiva.
Enquanto isso, em Brasília, o Congresso avança com ainda mais apetite. Parlamentares vêm ameaçando travar votações importantes se o governo não liberar mais dinheiro para emendas — mesmo diante de um cenário fiscal já bastante deteriorado. A chantagem é explícita: ou se paga o “preço político” ou o país não anda. O Planalto cede, na tentativa de manter uma base mínima de governabilidade, mas o custo disso tem sido o comprometimento de áreas essenciais como saúde, educação e investimentos públicos estruturantes.
O escândalo de São Luiz do Anauá, revelado em reportagem especial pelo UOL, não é um caso isolado. A falta de critérios técnicos para distribuição de emendas, o uso de intermediários e a ausência de prestação de contas estão alimentando redes de corrupção e perpetuação de poder político em pequenos municípios. Com a anuência — ou mesmo a ação direta — de parlamentares, parte dessas verbas serve para manter redutos eleitorais, financiar campanhas futuras e cooptar prefeitos, e não para melhorar a vida da população.
Para completar o cenário preocupante, outra investigação da Polícia Federal liga um assessor político a um dos maiores ataques cibernéticos já registrados contra o sistema financeiro brasileiro. A operação que movimentou mais de R$ 800 milhões teve como elo um colaborador de gabinete com acesso privilegiado. O crime não apenas comprometeu a segurança digital de milhões de brasileiros, como expôs a promiscuidade entre política e estruturas criminosas sofisticadas.
Em um país onde o Congresso se transforma em operadora financeira de si mesmo, onde municípios falem mesmo recebendo milhões e onde assessores políticos aparecem ligados a esquemas bilionários, é preciso perguntar: para quem servem as emendas parlamentares? Certamente não para o povo.
O modelo atual, longe de ser uma ferramenta de desenvolvimento, virou uma bomba-relógio para as contas públicas, a governabilidade e a democracia. As emendas, como vêm sendo operadas, são hoje uma das faces mais perigosas da captura do Estado por interesses privados e eleitorais.
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