COP 30: quando o preço da coxinha de camarão fala mais alto que o colapso do planeta
- Karina Pinto
- 9 de nov.
- 2 min de leitura

A COP 30 mal começou, e o foco de parte da cobertura jornalística brasileira parece ter se desviado do essencial. Em vez de destaque às discussões sobre clima, preservação ambiental e o papel da Amazônia no enfrentamento à crise global, o que ganhou as manchetes foram as reclamações sobre o preço dos alimentos — mais precisamente, o valor dos lanches dentro da chamada *Blue Zone*, área de acesso restrito a delegações e jornalistas.
O curioso é que a crítica não parte do público comum, mas de profissionais da imprensa, muitos deles oriundos do eixo Rio–São Paulo, acostumados a pautar o país e, infelizmente, a reproduzir olhares carregados de preconceito regional. Reclamar do preço de uma coxinha em um evento internacional pode até render um comentário espirituoso nas redes, mas quando esse tipo de “denúncia” ofusca o debate climático e ambiental, revela algo mais profundo: a resistência em reconhecer o protagonismo amazônico e a relevância do Pará como centro de discussões globais.
Há um entendimento equivocado — e, em certa medida, colonial — de que tudo o que vem da Amazônia deve ser barato, exótico e folclórico. É como se a região tivesse a obrigação de oferecer experiência, sabor e cultura a preço de souvenir. O incômodo com o custo de um lanche típico não é sobre economia: é sobre **valor**. Valorizar o que é produzido na Amazônia, seja alimento, arte ou conhecimento científico, parece ainda ser um desafio para quem insiste em olhar o Norte do país com lentes do sul.
A escolha de Belém como sede da COP 30 deveria ser celebrada como um marco histórico. É a primeira vez que um evento dessa magnitude acontece no coração da floresta, justamente o território que mais sente — e mais resiste — aos efeitos da crise climática. Mas, em vez de abrir espaço para o diálogo sobre soluções, justiça ambiental e saberes tradicionais, parte da imprensa prefere alimentar um discurso de ironia e desdém, minimizando o evento e reforçando estereótipos que o país deveria ter superado há décadas.
Enquanto isso, os debates verdadeiramente urgentes — sobre o aquecimento global, a transição energética e os riscos reais de colapso ambiental — aguardam espaço na pauta. É um contraste quase simbólico: dentro da Blue Zone, discutem-se os rumos do planeta; fora dela, nas manchetes, discute-se o preço da coxinha de camarão.
A COP 30 está acontecendo, e até aqui tem sido um sucesso. Belém acolhe o mundo com hospitalidade, cultura, sabor e identidade. Cabe agora à imprensa fazer o mesmo — acolher a responsabilidade de informar com profundidade, respeito e sensibilidade regional. Porque, diante do que está em jogo, **o planeta tem problemas mais graves do que o preço do lanche.**



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