top of page

Perto Demais da violência que fingimos não ver

  • Foto do escritor: Karina Pinto
    Karina Pinto
  • há 13 horas
  • 2 min de leitura
Imagem de Freepik
Imagem de Freepik

Por Ed Leite


Ela começa andando lentamente ao som de The Blower’s Daughter, que tem uma frase repetida como um mantra: I can’t take my eyes off you ("Não consigo tirar meus olhos de você").


Assim começa o filme Closer, com Natalie Portman num dos seus melhores papéis. Ela busca, mais que calmaria, uma resistência.

Com tantas notícias nos últimos dias desmascarando a quantidade de covardes (sim, covardes) que têm causado tanta dor e revolta por conta dos crimes de feminicídio no Brasil, lembrei desse filme de 2004.


Natalie interpreta uma mulher que os dois homens do filme tentam o tempo todo sufocar, cada um à sua maneira. O médico acha que pode examinar os sentimentos dela com a precisão de um bisturi. O escritor, com a sensibilidade que acredita possuir por escrever bonito.


É mais um fato que se concretiza diariamente: homens acreditando que uma mulher precisa caber num molde. Anna (Julia Roberts) também sofre na mão desses dois homens controladores. Enquanto Alice é um mistério para eles, Anna parece se encaixar na maturidade que falta a ambos.


Alguns homens, como Dan e Larry, não se contentam ou não sabem amar; querem "traduzir" a mulher como se a ela faltasse alguma coisa, explicando como deve ser e se portar. Isso, por si só, já é uma violência. Essa insistência é outra forma de agressão.


Anna não esconde nada, mas é pressionada por isso e sofre. Alice tem um segredo que pouca gente percebeu, mas que é fundamental para entender seu motivo, ainda mais depois de sua última conversa com Dan.

Nenhuma delas precisaria sofrer assim. Nenhuma mulher merece sofrer.


No Brasil, onde tantas outras Annas, Alices e Marias têm seus nomes interrompidos antes da hora — torturadas, violentadas, atropeladas, mutiladas, baleadas, queimadas — e acabam em manchetes de jornais num rompante inimaginável, revela-se a crueldade rotineira de homens contra mulheres.


A violência não se resume ao sangue ou ao hematoma. Ela não começa no tapa ou no feminicídio, mas na ideia de posse. Começa na violência silenciosa de quem acha que é dono do outro. É a mão que controla, que cerceia a liberdade, que manipula a conta bancária e as emoções. Essa violência invisível é a base de tudo: ao tratar a mulher como objeto de controle, abre-se o caminho fatal para todas as outras brutalidades que o Brasil conhece bem demais.


Alice anda no começo e no fim porque precisa afirmar esse território com o próprio corpo. Por isso, o nome que ela não entrega importa tanto: marca o limite que ninguém atravessa.


Anna fica porque ainda acredita que pode ser ouvida sem ser engolida. Toda mulher merece, pelo menos, esse limite inviolável. O direito de decidir quem ela é, de escolher seus passos, de não ser controlada. É sobre dignidade, autonomia. Que ninguém atravesse esse limite que define quem elas são.


O filme Closer - Perto Demais (2004), pode ser assistido na HBO.

Comentários


bottom of page