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Série da Netflix explora o dilema entre violência sexual e gravidez

Karina Pinto


Imagem: Divulgação Série Pedaço de Mim

Em cartaz no canal de streaming, a série “Pedaço de Mim” narra a história de um casal que enfrenta problemas no casamento gerados pelas tentativas sem sucesso de uma gravidez. Um dia, após tentarem mais uma vez, os dois acabam brigando e o marido sai de casa supostamente para uma semana de viagem a trabalho. Nesse intervalo, uma amiga da protagonista, vivida pela atriz Juliana Paes, a convida para uma noite de diversões, mas para a personagem, a noite encerra com um estupro praticado por um homem que ela conhecia desde a infância. 


Pouco tempo depois ela descobre que a tão sonhada gravidez chegou, mas algo a incomoda a ponto dela fazer um exame de DNA. O resultado comprova que além de estar grávida de gêmeos, um dos bebês não é do marido. Apesar de parecer fictícia, a história é baseada em fatos reais, e descreve o sofrimento de uma mulher vítima de uma violência sexual, e que ainda precisa carregar um filho resultado desse estupro. A autora não deixa claro se na história real um dos bebês também é fruto de um abuso sexual. 


Sucesso de público no Brasil, a série expõe um dilema enfrentado por mulheres e meninas no país, que vítimas de abusos sexuais, muitas vezes praticados por homens que fazem parte do seu cotidiano, se descobrem grávidas desse abusador. Para especialistas em saúde mental, é necessário reconhecer a profundidade e complexidade emocional que tal situação envolve, e lembrar que cada indivíduo é único, e as reações e sentimentos podem variar.


O trauma da violência sexual impacta profundamente a saúde mental da vítima. O estupro é uma violação física e emocional que pode resultar em Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT), depressão, ansiedade, e sentimentos intensos de vergonha, culpa e impotência. Quando a violência sexual resulta em gravidez, esse trauma pode ser amplificado, tornando ainda mais difícil lidar com a situação. A gravidez em si pode servir como um lembrete constante do abuso, dificultando o estabelecimento de laços afetivos com a criança.


A formação de vínculos afetivos com um filho envolve uma série de fatores emocionais e psicológicos, incluindo sentimentos de amor, proteção e conexão. No entanto, no contexto de uma gravidez resultante de estupro, a criança pode ser percebida como uma representação do agressor, desencadeando sentimentos ambíguos ou até mesmo aversão. Esses sentimentos podem dificultar o desenvolvimento de um apego saudável e amoroso. A mulher pode enfrentar conflitos internos entre o desejo de amar e proteger a criança e a dor e o sofrimento associados à origem da gravidez.


Há também uma pressão social e cultural significativa sobre a maternidade. A sociedade tende a idealizar o papel da mãe e esperar que toda mulher desenvolva um amor natural e incondicional por seu filho. Quando isso não ocorre, especialmente em situações de violência sexual, a mulher pode se sentir culpada ou inadequada, o que agrava ainda mais seu sofrimento. Ela pode lutar com a culpa por não conseguir sentir o que "deveria" sentir, ao mesmo tempo em que tenta processar suas próprias emoções e traumas.


É importante validar os sentimentos da mulher, reconhecer o sofrimento e oferecer um espaço seguro para ela expressar suas emoções sem julgamento. O objetivo seria ajudá-la a processar o trauma da violência e a lidar com os sentimentos conflitantes em relação à criança. Cada mulher enfrentará esse dilema de maneira única, e a melhor abordagem é sempre aquela que respeita suas experiências e sentimentos individuais. Em todos os casos, profissionais em saúde mental devem ser consultados, para que essa mulher seja acompanhada de forma correta.


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