Enquanto governo tenta taxar os mais ricos, Congresso amplia privilégios e empurra país para o abismo da desigualdade
- Karina Pinto
- 13 de jun.
- 2 min de leitura

Por mais que o governo federal tente avançar com medidas que promovam justiça tributária e reequilibrem as contas públicas, os obstáculos seguem vindo de onde deveriam partir as soluções: o Congresso Nacional. Nos últimos meses, a tentativa do Planalto de aumentar a cobrança de impostos sobre os mais ricos tem esbarrado na resistência de parlamentares que, em sua maioria, representam justamente a elite econômica do país.
O Brasil tem hoje um dos sistemas tributários mais injustos do mundo: os mais pobres pagam proporcionalmente muito mais impostos do que os mais ricos. Em países desenvolvidos, tributar grandes fortunas, lucros e dividendos é prática comum — no Brasil, ainda é tabu. E não por falta de tentativa. A taxação de fundos exclusivos, a revisão de isenções fiscais bilionárias e o combate a manobras de offshores são propostas em curso que visam justamente corrigir esse desequilíbrio histórico. Mas nada disso avança sem que se passe pelo crivo do Legislativo.
É aí que mora o problema. A atual composição do Congresso é formada, em grande parte, por empresários, fazendeiros e representantes de grupos religiosos com patrimônio acumulado e interesses muito bem definidos. Não se trata apenas de divergência ideológica, mas de uma resistência clara em cortar na própria carne. A lógica é simples: mexer nos privilégios da base, tudo bem; tocar nos benefícios do topo, nem pensar.
Enquanto a agenda da justiça tributária é travada, avança no Parlamento uma série de medidas que caminham na direção oposta. Propostas que aumentam salários, ampliam o número de cadeiras na Câmara dos Deputados e agora discutem até a vinculação do salário de parlamentares ao teto do INSS mostram uma total desconexão com a realidade do país. A tentativa de institucionalizar aumentos automáticos em uma das Casas mais caras do mundo soa como provocação a uma população que mal consegue se aposentar com dignidade.
A conta não fecha. A desigualdade brasileira é sustentada por um sistema que cobra mais de quem tem menos e protege quem tem mais. Economistas sérios alertam: sem taxar os verdadeiros privilegiados — e isso inclui setores intocáveis como o agronegócio exportador, os rentistas e grandes conglomerados —, o Brasil continuará em um ciclo vicioso de cortes nos serviços públicos, arrocho fiscal e aumento da pobreza.
O que está em jogo não é apenas o orçamento, mas a própria credibilidade do sistema democrático. Como confiar em instituições que se blindam enquanto pedem sacrifício da população? Como sustentar um Estado onde o topo da pirâmide se recusa a abrir mão de benesses mesmo diante de uma crise social persistente?
A mudança não virá de cima para baixo. Só com pressão popular, transparência e mudança no comportamento do eleitorado será possível romper com esse ciclo. Enquanto isso não acontece, o país segue na encruzilhada: de um lado, a tentativa tímida de construir justiça fiscal; do outro, um Congresso que age como se governasse para si mesmo.
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