“Ainda Estou Aqui”: o Oscar brasileiro e a memória que resiste

O cinema brasileiro conquistou, pela primeira vez, o Oscar de Melhor Filme Internacional com "Ainda Estou Aqui", dirigido por Walter Salles. A produção retrata a luta de Eunice Paiva, interpretada por Fernanda Torres e Fernanda Montenegro, em busca de respostas sobre o desaparecimento de seu marido, o ex-deputado Rubens Paiva, vítima da repressão durante a ditadura militar. A vitória não é apenas um marco para o audiovisual nacional, mas também um lembrete contundente sobre a necessidade de preservar a memória histórica e fortalecer a democracia.
A história por trás da história
O desaparecimento de Rubens Paiva é um dos episódios mais emblemáticos da violência estatal durante a ditadura brasileira (1964-1985). Seu corpo nunca foi encontrado, e a luta incansável de sua esposa por justiça simboliza a dor de tantas famílias que perderam entes queridos para o autoritarismo. Ao trazer essa história para as telas, "Ainda Estou Aqui" não apenas homenageia Eunice e sua coragem, mas também convida o público a refletir sobre os impactos de um passado que insiste em ecoar no presente.
A vitória do filme coincide com um momento crítico da história política brasileira. Enquanto a justiça julga os responsáveis pelos ataques de 8 de janeiro de 2023 – quando manifestantes extremistas invadiram as sedes dos Três Poderes em Brasília –, também acompanhamos processos contra o ex-presidente Jair Bolsonaro, acusado de tentar minar a democracia e fomentar discursos golpistas. Paralelamente, grupos que defendem a volta do regime militar ainda encontram espaço para se manifestar, provando que as ameaças à democracia não ficaram para trás.
No Brasil, a memória sobre a ditadura é constantemente atacada por narrativas revisionistas que tentam minimizar ou negar os crimes cometidos pelo regime. O reconhecimento internacional de "Ainda Estou Aqui" reforça a importância de manter viva essa história, garantindo que novas gerações compreendam os perigos do autoritarismo. A arte tem um papel fundamental na construção da consciência crítica, e o sucesso do filme demonstra como a cultura pode ser uma ferramenta poderosa na defesa da democracia.
Um prêmio para a resistência
Ao dedicar o prêmio às mulheres que lutaram e ainda lutam por justiça, Walter Salles ressaltou que o filme é mais do que uma obra cinematográfica: é um ato de memória e resistência. Num país onde a impunidade ainda é uma ferida aberta e onde discursos antidemocráticos continuam a ganhar espaço, o filme surge como um lembrete incômodo, mas necessário, de que a história não pode ser esquecida.
O Brasil celebra esse Oscar não apenas como uma vitória do cinema, mas como uma reafirmação do compromisso com a verdade, a justiça e a democracia.
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